quarta-feira, 17 de agosto de 2011

Política nanica

Artigo do professor André Haguette no Jornal OPOVO de domingo:

Acometido de uma hérnia de disco deixei de escrever neste espaço durante alguns meses. No intervalo vários eventos merecedores de comentários ocorreram. Entre outros, o aumento da carga horária mínima anual no ensino básico (escola fundamental e média) de 800 para 900 horas, o que significa que os alunos passam a ter quatro horas e 50 minutos de tempo letivo por dia. A grande falha da escola pública reside no fato de o ensino efetivo não preencher todo o tempo exigido em sala de aula.

Outro evento positivo foi o lançamento do programa de combate à miséria tendo como alvo o contingente de 16,2 milhões de pessoas que ganham até RS 70 ao mês. Na campanha eleitoral, a candidata prometia um alvo maior. Mas vá lá, atingir 16 milhões já será uma conquista.

Está sendo extremamente saudável e marcante o baixo nível de tolerância da presidente Dilma à corrupção e as demissões do ministro Palocci e de membros dos ministérios dos transportes e da agricultura vão na direção, a da eliminação da impunidade. O exemplo há de vir do alto.

Finalmente, menciono a decisão polêmica do Supremo Tribunal Federal de reconhecer a união homoafetiva. Além da afirmação do “reino da igualdade absoluta, pois não se pode alegar que os heteroafetivos perdem se os homoafetivos ganham” (ministro Ayres Britto), firma-se um estado laico e republicano que deve atender a todos, independentemente de credos religiosos e éticos. A lei, num Estado de Direito, deve incluir todos, embora a sociedade civil mantenha diferenças.

Mas se o Brasil vive bons momentos, mormente na economia e na criação de empregos com carteiras assinadas, apesar de uma inflação elevada, faz dor constatar o alto nível de corrupção e a debilidade da cultura e vida política. Por mais que se avance em vários setores da vida nacional, a política continua atrasada e em nome da falsa compreensão do que seja a governabilidade o comportamento dos partidos políticos elimina toda e qualquer forma de oposição vigilante e persistente, maculando a nossa jovem democracia.

A democracia liberal representativa exige para seu bom funcionamento o dualismo funcional de “governo e oposição”. Sem oposição firme mais aberta ao diálogo caminha-se para a ditadura de um grupo só. O instituto capital das eleições é claro: governa que tem a confiança da maioria e fica na oposição quem obtém uma votação minoritária. Mas neste nosso Brasil contemporâneo todos os partidos e deputados querem gozar das benesses do governo, falsificando o jogo político e deixando os eleitores a ver navios, com seu voto tornado inútil.

A ausência de oposição fica dramática quando nem escândalos do porte daqueles que estão ocorrendo no Ministério dos Transportes, na esfera federal, e nem o escândalo dos kits sanitários, no âmbito estadual, conseguem provocar uma CPI ou mesmo convocar pessoas supostamente envolvidas a prestarem esclarecimentos na Assembleia, a Casa do Povo. O grande Max Weber considerava as Comissões Parlamentares uma marca central da democracia, um ativo parlamento tendo que supervisionar a administração.

Enquanto o País melhora em muitos aspectos, a cultura política partidária retrocede com a cumplicidade dos governantes e o silêncio impotente dos governados. O Congresso e as Assembleias continuam, portanto, obsoletos, irresponsáveis e, o mais triste, dispensáveis.

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